Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa

Redes sociais devem privilegiar essencialmente os usuários. Disso, imagino, poucas pessoas discordam. Sem usuários não há audiência. E sem audiência, bem, sabemos. Mas vamos considerar uma coisa: de onde vem a receita dessa “brincadeira”? Quem paga a conta? Parece bastante claro que nesse momento ainda são as grandes empresas que bancam tudo isso com seus investimentos em mídia. E esse é o ponto. 

Difícil equilibrar as duas coisas. Via de regra, desejo de usuário e de anunciante não costumam combinar. Os anunciantes querem aparecer. O internauta (já me sinto meio velho utilizando essa palavra) reclama demais dos modelos intrusivos e assim seguimos já há alguns anos na mídia digital. E com as redes sociais a coisa não é muito diferente. Mas, digamos, que o Facebook está forçando um pouco a mão.

No início de outubro foram anunciadas mudanças feitas pela rede que, na prática, diminuíram a relevância das páginas e o volume/forma em que os conteúdos aparecem no feed dos usuários. O pessoal do Mestre dos Sites explicou isso. A matéria de origem pode ser lida aqui

Vamos ser honestos. A política é modificada quase diariamente. Mas essa é uma alteração e tanto da regra do jogo. Especialmente para quem depende essencialmente da mídia de anunciantes, ou seja, empresas. O Techcrunch, portal especializado em tecnologia, divulgou uma informação que mostra a versão do Facebook para o fato.

A argumentação da rede social – e defesa de que não há perda de relevância – é a seguinte:

1. Quanto mais likes o usuário dá no seu conteúdo, mais ele aparece no feed do usuário – concluímos que o Like é tão importante quanto o compartilhamento, certo?

2. Se o post for ignorado pelos usuários, a tendência é que seu conteúdo seja menos mostrado, portanto, apareça menos na timeline dos usuários – para isso dependemos de likes, shares e comentários.

3. Exposição pelo formato do conteúdo – se os usuários costumam curtir ou compartilhar suas fotos no passado – é esse formato de conteúdo que tende a ser mais exibido no feed dos usuários.

4. Se um post foi encarado pelos usuários como negativo ou os usuários reclamaram demais dele, o conteúdo de sua página será menos visto pelos usuários. Isso começou a ser mais utilizado em setembro de 2012 com mais força.

A defesa parece parece bastante fraca e subjetiva. Os critérios de comentários negativos adotados pelo Facebook não são claros até hoje. O Insights – ferramenta analítica da rede social – sequer consegue trazer dados confiáveis. Não há motivos reais que expliquem os critérios utilizados. Da mesma forma, não fica exposto o modelo de tempo. Se os usuários curtiram muito a área de fotos, por exemplo. Mas fotos entraram no início desse ano, até então tínhamos o conteúdo praticamente baseado em texto, desde quando estão considerando o volume? E sobre os Likes e Shares, qual é a metodologia que garante o aumento da exposição? Qual é o limite? Isso também não ficou explícito em nenhum momento.

Aqui é possível encontrar um post em que o Facebook nega a criação desse novo modelo para vender mais anúncios, mas até aí, morreu Neves. Com o fracasso inicial no IPO, eles terão de se provar como rentáveis mais do que nunca e, principalmente, entregar resultados para os acionistas, que ficaram bem descontentes com a confiança (de lançar ações tão altas) e com o buraco (prejuízo que tiveram na abertura de capital).

Será que esses foram os motivos que levaram a GM a anunciar publicamente não acreditar na efetividade do Facebook em mídia? Ou seria a hegemonia dessa rede social o maior problema. Afinal, um concorrente de peso nunca fez mal a ninguém.

Especialista em mídias sociais ou especialista em comunicação?

As mídias sociais vêm dominando o mundo atual da comunicação. Eventos, discussões, grupos, estudos, reportagens levam algumas poucas soluções e muito mais dúvidas para quem trabalha neste segmento. A capacidade de discernimento é o que realmente conta. Isso porque é muito fácil encontrar consultorias e especialistas em mídias sociais. É preciso tomar muito cuidado com essas denominações.

Especialista pressupõe dois aspectos: o primeiro é a formação, ou seja, o profissional é um grande estudioso, mestre em mídias sociais/comunicação digital. O segundo é a experiência, quero dizer, ele trabalha há muitos e muitos anos com esse nicho, o que lhe dá bagagem necessária para tomar decisões com racionalidade.

Posso estar enganado, mas não consigo enxergar nenhum desses dois aspectos na grande massa de profissionais atualmente. Trata-se de um mercado ainda bastante novo que ganhou força efetivamente nos últimos dois ou três anos. Com isso, a academia ainda não conseguiu consolidar seus posicionamentos e visões. Na outra ponta, quem já trabalha com esse mercado tem, vá lá, uns cinco anos de experiência (o que não pode ser descartado, mas ainda é pouco). Ainda assim, também estão mais tateando do que qualquer outras coisa.

As empresas seguem a mesma trilha. Na ânsia de se posicionarem, de colocarem suas empresas e marcas no ambiente digital de forma positiva – claro, sempre pensando no retorno financeiro – acabam enfiando os pés pelas mãos. Talvez também por não saberem comprar, por ser algo tão novo quanto para elas.

Nesse caminho, começam a buscar os tais especialistas em mídias sociais. Um erro? Não sou tão pretensioso. Diria que é um risco. Antes de mais nada, temos de pensar que para lidar com este universo, o profissional tem de ser especializado em comunicação. E não estou aqui querendo blindar a categoria de jornalistas, RPs, publicitários. Mas a visão macro de comunicação é essencial para o desenvolvimento de bom trabalho com uma marca no ambiente digital.

Não basta conhecer a dinâmica e as especificidades de Twitter, Facebook, Orkut. É bastante óbvio que essas competências são importantes, mas resumem demais o modelo de negócio. A atuação em mídias sociais exige muito mais, já que tudo isso não passa de ferramenta (meio). Estamos falando de um nicho muito mais próximo da antropologia e sociologia, do estudo do comportamento das pessoas, do ser humano, do que de tecnologia. É isso que as empresas e agências deveriam priorizar.

Impossível negar que ainda há uma carência grande de conhecimento sobre o mercado de mídias sociais por parte dos profissionais de comunicação. Conheço jornalistas e RPs brilhantes que pouco se interessam, que não correm atrás, que sequer sabem o mínimo de comunicação digital. E isso, claro, também é um risco. Ainda há um bom espaço para o mercado de comunicação tradicional e ele não vai deixar de ser importante. Cada vez mais, porém, vamos ver esses dois universos de forma indissociável.

Mídia alternativa? Talvez…

Gostei muito do texto escrito por Thais Pontes para o Yahoo! Posts. Em poucas linhas ela resumiu bem o que vem se tornando o mercado de blogs no Brasil. Ela levanta um ponto crucial do modelo/mercado de mídia social atualmente.

Sim, tudo é novo ainda para as empresas. Sim, é um mercado sem consolidação suficiente que gere metodologias padronizadas. Os blogs estão se transformando em mídia tradicional? Não sou contra – nem nunca fui – ao modelo de post pago. Aliás, nem sei porque retomei essa já batida discussão. Assim como em diversos mercados, se há produção de conteúdo relevante, creio que ela precise ser remunerada. Ninguém trabalha de graça. O ditado “tempo é dinheiro” continua mais válido do que nunca.

Mas é perceptível que muitos blogs perderam a espontaneidade e a liberdade editorial/criativa por conta de suas amarrações comerciais. Parecem muito mais próximos de veículos de comunicação do velho mundo do que imaginam. E teimam em dizer que não, não assumem esse processo como mídia.

O trabalho de RP Digital deve incorporar esse processo de publicidade – se considerarmos que o post ou tweet pago é mídia?

Na teoria sim. Afinal, o conceito puro de RP vai além da assessoria de imprensa, apesar do mercado brasileiro não trabalhar dessa forma. Já trabalhei com empresas que se recusam a fazer post patrocinado porque não querem forçar a barra ou enfiar sua marca guela abaixo do público do blogueiro.

Há milhares de argumentações contra e a favor, mas é algo a se considerar. Em pouco tempo, esse processo será engolido pelos departamentos de mídia das agências de publicidade e fim de papo.

Quando as empresas vão entender?

Trabalhar com comunicação no Brasil é algo bastante complicado. Quem está nesse mercado sabe bem o que estou dizendo. Já falei aqui diversas vezes que os conceitos parecem complexos demais para as empresas. Com as mídias sociais então, vixe, o negócio ficou ainda mais nebuloso. Não entenderam ainda que a comunicação, na maioria dos casos, é semelhante ao direito ou à legislação fiscal: em mutação constante, exigindo atualização freqüente do conhecimento.

As estratégias de atuação no ambiente digital ainda não ganharam contornos a ponto de criar padrões no mercado. E isso traz ainda mais dúvidas. Se até mesmo os profissionais de comunicação estão aprendendo com os novos meios, os gestores das empresas não têm obrigação, diriam alguns.

Isso não é uma verdade absoluta. Eles deveriam, sim, conhecer. Afinal, como vão exigir uma postura profissional e competente de uma empresa de comunicação se não sabem o que desejam, se não conhecem ou, ao menos, experimentaram estes novos canais digitais para cobrarem um serviço proativo, um gerenciamento da reputação da companhia? Colocar a marca/produto/serviço de uma empresa nas mãos de uma agência é uma responsabilidade e tanto.

Outro dia, numa conversa informal com um amigo, falávamos sobre a febre das redes sociais. O papo caiu para o modismo de algumas opções de mídias. Uma hora é um Second Life que está por cima da carne seca. Outra hora aparece um Twitter que o povo abraça. Este é – e sempre foi – o modelo do mercado de tecnologia. As mídias podem ser passageiras, mas a necessidade de comunicar não só é eterna como cresceu exponencialmente com a internet.

Muitas ainda teimam em aplicar recursos em ações completamente isoladas. Nada contra as campanhas digitais. Longe disso. Eu acho que os meios precisam ser aproveitados em sua plenitude, mesmo que e principalmente para a divulgação de iniciativas pontuais. Mas, em alguns momentos, parecem acreditar em milagres da multiplicação, esperam resultados de mídia de massa com campanhas nas redes sociais. Muitas companhais não entenderam e não dão a devida atenção à proposta de nicho desses novos meios.

Algumas empresas – e muitos gestores por aí – ainda acham que conseguirão reverter situações críticas, problemas com consumidores, falhas operacionais com campanhas em mídias diversas, inclusive digitais. Não percebem que investir em rede/mídias sociais é parcela de uma estratégia muito maior e integrada de comunicação.

Simplesmente, não entenderam que comunicação não resolve problema de gestão!

Força de vontade

Realmente para tentar entender um pouquinho esse novo ambiente de negócios e de trabalho criado a partir das mídias sociais. Digo pouco porque trata-se de algo muito recente e histórico ao mesmo tempo: o ser humano. Quantas vezes não vimos empresas que investiram milhões em sistemas para conquistar a fidelidade dos consumidores, chamar a atenção deles, cativá-los de alguma forma. Pesquisas e mais pesquisas indicando perfis, hábitos, etc? E ainda não há um resultado.

No caso das mídias sociais, essas dúvidas que matam do coração centenas de gerentes e diretores de marketing são mais perceptíveis ainda. É igual casamento. Se você acha que vai mudar a pessoa com a qual está casando, esqueça. Os defeitos dela vão sobressair ainda mais, porque você estará ao lado dela por muito mais tempo. Briga e vai dormir na mesma cama, não pega o carro e volta pra casa da mãe. Tem que resolver ali, na hora.

Volto a bater na tecla que trata-se de relacionamento com pessoas. As empresas não se relacionam com empresas. O B2B, por mais que envolva milhões de plataformas e software, ainda vai ser desenhado de alguém para alguém, de uma pessoa para outra, de um ser para suprir a necessidade de negócios de outro ser.

É isso que as companhias precisam entender quando vão se arriscar nas mídias sociais. O medo é natural, como foi em qualquer novo meio que surgiu. Mas vai ter de ser na base do acerto e erro. Cá entre nós, isso envolve transparência, algo que o mercado não está muito habituado. Quem trabalha no mercado farmacêutico sabe bem disso. Qualquer tipo de informação é classificada como “extremamente confidencial”.

Querem resolver boa parte dos problemas? Comecem dentro de casa. Melhorem os serviços e interação de seus próprios portais corporativos, de suas salas de imprensa. Acertem processos internos, por mais que doa assumir muitos e muitos erros. Aperfeiçoem o atendimento e, principalmente, entregue o que vocês prometem. Assim, a possibilidade de sofrer nas mídias sociais com casos negativos é muito menor.

Simples? Claro que não. Isso dá um trabalho do cão porque – mais uma vez – mexer com processos envolver pessoas e blá blá blá. Estão cansados de saber disso. Mas façam. Ajam. Reajam. Só um pouquinho de força de vontade. Parem de pensar somente no bônus de final de ano bem gordo e estudem a sustentabilidade dos negócios em sua essência (não só sob a ótica de resposabilidade social e meio ambiente).

Começando por aí vão ver como fica muito mais gostoso e honesto participar desse turbilhão que se transformou a mídia social.