Jornalismo X publicidade

Eu estava em casa outro dia conversando com a minha esposa – que também é jornalista – sobre as notícias ridículas que vimos em portais. Aquela história de Tostines (o público lê porque é o que tem – ruim – ou é ruim porque é o que o público lê). Então me veio na cabeça o “a publicidade que sustentou o jornalismo durante quase toda sua existência está matando o jornalismo”. Especialmente no online. Posso estar falando uma grande asneira porque não é uma pesquisa, uma avaliação aprofundada. E isso é uma discussão muito mais complexa do que um post de Facebook. Publicitários não me matem. Mas vocês discordam?

O que efetivamente paga as contas de um veículo? A publicidade, correto? Os demais meios de faturamento (assinatura, venda em banca, online, etc) não são suficientes para bancar a estrutura de um veículo. Quando falamos de online, principalmente, é uma apelação sem fim no conteúdo produzido. E cada vez mais apelação.

Há disputas e brigas sérias entre tipos de conteúdo, por exemplo, que vão para entretenimento e esporte. Ambos editores brigam pra colocar “Neymar leva o filho para a praia” porque precisam bater suas metas de audiência. E, sim, isso é um tipo de informação que vai trazer muitos cliques. Mas isso é esporte (por se tratar de um craque do futebol) ou é entretenimento porque traz uma informação de lazer do jogador?

E qual o motivo da apelação? Trazer audiência, cliques, número de páginas vistas. E o que é vendido para as marcas? A mesma audiência, cliques, número de vistas. Então, no fim, é sempre a busca sem freios (e sem pudores) pela audiência para, lá na frente, apresentar para as agências de publicidade e trazer anunciantes que pagam a conta. E assim temos o jornalismo que é feito hoje e tão criticado por quem faz parte disso tudo, mas também precisa pagar suas contas em casa.

Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa

Redes sociais devem privilegiar essencialmente os usuários. Disso, imagino, poucas pessoas discordam. Sem usuários não há audiência. E sem audiência, bem, sabemos. Mas vamos considerar uma coisa: de onde vem a receita dessa “brincadeira”? Quem paga a conta? Parece bastante claro que nesse momento ainda são as grandes empresas que bancam tudo isso com seus investimentos em mídia. E esse é o ponto. 

Difícil equilibrar as duas coisas. Via de regra, desejo de usuário e de anunciante não costumam combinar. Os anunciantes querem aparecer. O internauta (já me sinto meio velho utilizando essa palavra) reclama demais dos modelos intrusivos e assim seguimos já há alguns anos na mídia digital. E com as redes sociais a coisa não é muito diferente. Mas, digamos, que o Facebook está forçando um pouco a mão.

No início de outubro foram anunciadas mudanças feitas pela rede que, na prática, diminuíram a relevância das páginas e o volume/forma em que os conteúdos aparecem no feed dos usuários. O pessoal do Mestre dos Sites explicou isso. A matéria de origem pode ser lida aqui

Vamos ser honestos. A política é modificada quase diariamente. Mas essa é uma alteração e tanto da regra do jogo. Especialmente para quem depende essencialmente da mídia de anunciantes, ou seja, empresas. O Techcrunch, portal especializado em tecnologia, divulgou uma informação que mostra a versão do Facebook para o fato.

A argumentação da rede social – e defesa de que não há perda de relevância – é a seguinte:

1. Quanto mais likes o usuário dá no seu conteúdo, mais ele aparece no feed do usuário – concluímos que o Like é tão importante quanto o compartilhamento, certo?

2. Se o post for ignorado pelos usuários, a tendência é que seu conteúdo seja menos mostrado, portanto, apareça menos na timeline dos usuários – para isso dependemos de likes, shares e comentários.

3. Exposição pelo formato do conteúdo – se os usuários costumam curtir ou compartilhar suas fotos no passado – é esse formato de conteúdo que tende a ser mais exibido no feed dos usuários.

4. Se um post foi encarado pelos usuários como negativo ou os usuários reclamaram demais dele, o conteúdo de sua página será menos visto pelos usuários. Isso começou a ser mais utilizado em setembro de 2012 com mais força.

A defesa parece parece bastante fraca e subjetiva. Os critérios de comentários negativos adotados pelo Facebook não são claros até hoje. O Insights – ferramenta analítica da rede social – sequer consegue trazer dados confiáveis. Não há motivos reais que expliquem os critérios utilizados. Da mesma forma, não fica exposto o modelo de tempo. Se os usuários curtiram muito a área de fotos, por exemplo. Mas fotos entraram no início desse ano, até então tínhamos o conteúdo praticamente baseado em texto, desde quando estão considerando o volume? E sobre os Likes e Shares, qual é a metodologia que garante o aumento da exposição? Qual é o limite? Isso também não ficou explícito em nenhum momento.

Aqui é possível encontrar um post em que o Facebook nega a criação desse novo modelo para vender mais anúncios, mas até aí, morreu Neves. Com o fracasso inicial no IPO, eles terão de se provar como rentáveis mais do que nunca e, principalmente, entregar resultados para os acionistas, que ficaram bem descontentes com a confiança (de lançar ações tão altas) e com o buraco (prejuízo que tiveram na abertura de capital).

Será que esses foram os motivos que levaram a GM a anunciar publicamente não acreditar na efetividade do Facebook em mídia? Ou seria a hegemonia dessa rede social o maior problema. Afinal, um concorrente de peso nunca fez mal a ninguém.

Mídia alternativa? Talvez…

Gostei muito do texto escrito por Thais Pontes para o Yahoo! Posts. Em poucas linhas ela resumiu bem o que vem se tornando o mercado de blogs no Brasil. Ela levanta um ponto crucial do modelo/mercado de mídia social atualmente.

Sim, tudo é novo ainda para as empresas. Sim, é um mercado sem consolidação suficiente que gere metodologias padronizadas. Os blogs estão se transformando em mídia tradicional? Não sou contra – nem nunca fui – ao modelo de post pago. Aliás, nem sei porque retomei essa já batida discussão. Assim como em diversos mercados, se há produção de conteúdo relevante, creio que ela precise ser remunerada. Ninguém trabalha de graça. O ditado “tempo é dinheiro” continua mais válido do que nunca.

Mas é perceptível que muitos blogs perderam a espontaneidade e a liberdade editorial/criativa por conta de suas amarrações comerciais. Parecem muito mais próximos de veículos de comunicação do velho mundo do que imaginam. E teimam em dizer que não, não assumem esse processo como mídia.

O trabalho de RP Digital deve incorporar esse processo de publicidade – se considerarmos que o post ou tweet pago é mídia?

Na teoria sim. Afinal, o conceito puro de RP vai além da assessoria de imprensa, apesar do mercado brasileiro não trabalhar dessa forma. Já trabalhei com empresas que se recusam a fazer post patrocinado porque não querem forçar a barra ou enfiar sua marca guela abaixo do público do blogueiro.

Há milhares de argumentações contra e a favor, mas é algo a se considerar. Em pouco tempo, esse processo será engolido pelos departamentos de mídia das agências de publicidade e fim de papo.